OJB lança carta de repúdio à redução da maioridade penal

Belo Horizonte, 24 de março de 2015.

 

Sr. Deputado Arthur Lira (PP/AL) M. D Presidente da Comissão de Constituição Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados

 

Sr. Deputado Aguinaldo Ribeiro (PP/PB)

 

M.D 1º Vice-Presidente da Comissão de Constituição Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados

 

Sr. Deputado Osmar Serraglio (PMDB/PR)

 

M.D 2º Vice-Presidente da Comissão de Constituição Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados

 

Sr. Deputado Veneziano Vital do Rêgo (PMDB/PB)

 

3º Vice-Presidente da Comissão de Constituição Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados

 

Srs. Deputados Membros Titulares da Comissão de Constituição Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados

 

O Observatório da Justiça Brasileira, por meio de seus coordenadores Prof. Leonardo Avritzer e Profa. Marjorie Corrêa Marona, do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais, e Profa. Lilian Cristina Bernardo Gomes, pesquisadora do Centro de Estudos Sociais da América Latina, vem por meio da presente nota manifestar-se contrário às propostas de emenda constitucional que pretendem a redução da maioridade penal.

 

A proposta de redução da maioridade penal é inconstitucional, razão pela qual deve ser definitivamente rejeitada. O artigo 228 da Constituição Federal, que trata da imputabilidade penal, estabelecendo o marco de 18 anos, configura-se em um direito individual. Como tal, não pode ser objeto modificação, constitui-se como cláusula pétrea (art. 60, 4º), uma limitação material ao poder de reforma da Constituição.

 

A idade de 18 anos, ademais, passou a ser referência mundial para a responsabilização penal com o advento da Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança, ratificada pelo Brasil pelo Decreto Legislativo 28/1990 e promulgada pelo Decreto 99.710/1990. O Estado Brasileiro é signatário da Carta da ONU, bem como da referida Convenção, devendo, portanto, seguir honrando com os compromissos contraídos em âmbito internacional.

 

Soma-se a isso o fato de que as Cortes Internacionais de Direitos Humanos firmaram entendimento em sentido contrário à possibilidade de supressão de direitos sociais já conquistados por lei posterior, pela assunção do princípio da vedação ao retrocesso social. Os direitos relativos à infância são considerados direitos sociais (art. 6º) e, portanto, não podem ser suprimidos ou reduzidos.

 

Ressalte-se, por outro lado, que a submissão de adolescentes ao Código Penal e, portanto, ao sistema carcerário dos adultos, não se desdobrará em redução da criminalidade, como muitos supõem. Pesquisa do Ministério da Justiça aponta que a população carcerária no Brasil entre 1995 e 2005 saltou de 148 mil presos para 361.402, inobstante as inúmeras medidas de endurecimento do sistema penal adotadas ao longo dos anos, particularmente a promulgação da Lei dos Crimes Hediondos (Lei n.º 8.072/1990), aprovada após forte clamor social. Pesquisas também apontam que que a reincidência dos adultos submetidos ao sistema prisional corresponde a 70%, sendo que a reincidência dos adolescentes submetidos a medidas socioeducativas corresponde apenas a 20%, o que aponta para o fato de que o sistema penal não é adequado e suficiente para prevenir a prática de novos delitos.

 

Para além dos indicadores domésticos pode-se aprender com a experiência internacional. Nos países que reduziram a maioridade penal, não se observou redução da criminalidade. Aliás, Alemanha e Espanha retrocederam na decisão diante da ineficácia da medida.

 

A redução da violência e da criminalidade não está atrelada, portanto, ao endurecimento do sistema penal ou a redução da maioridade penal. Depende da implementação de políticas públicas sociais. O encarceramento massificado de jovens e adultos representa um retrocesso que o Brasil não pode tolerar e com o qual não merece conviver.

 

Pelo exposto, o Observatório da Justiça Brasileira soma-se a tantas outras vozes para considerar inconstitucional a proposta de emenda constitucional com vistas à redução da maioridade penal, a qual fere, ainda, as obrigações contraídas pelo Estado Brasileiro em âmbito internacional e, resta inútil à finalidade de conferir maior segurança à população. Deverá, portanto, deverá ser rejeitada.

 

 

Dr. Leonardo Avritzer

Coordenador do Observatório da Justiça Brasileira Professor Titular do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais

 

Dra. Marjorie Corrêa Marona

Coordenadora do Observatório da Justiça Brasileira Professora Adjunta do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais

 

Dra. Lilian Cristina Bernardo Gomes

Coordenadora do Observatório da Justiça Brasileira Pesquisadora do Centro de Estudos Sociais da América Latina

 

Conteúdos Relacionados

O protagonismo do STF e o silêncio dos demais Poderes
O Decreto 4887/2003 é uma regra de justiça.
O destino do direito quilombola no Brasil e a votação do STF
Carta Aberta ao STF, por Boaventura de Sousa Santos
STF julga a regularização de quilombos
Editorial